domingo, maio 14, 2006

Medalha de prata

O celular fez um barulho avisando que havia mensagem de texto, “porque há coisas mais fáceis de se escrever do que se dizer”, pensou a garota. Tinha acabado de acabar de sair da adolescência e estava aprendendo que havia mais espinhos no mundo do que rosas em seu jardim. A mensagem não era dele, o que a fez ter raiva daquele toque de mensagens que costumava soar tão belo aos seus ouvidos, porque sempre trazia palavras doces, às vezes até picantes. Essa era do outro, o que ela não ligava. O outro ligava até demais e ela não gostava das coisas fáceis, mas também não gostava de passar fome.
Desejou que o outro sofresse como ela sofria agora, porque se todos estivessem sofrendo, ela se sentiria parte do mundo. Logo ela que se preocupava demais em não fazer os outros sofrerem, mesmo que isso lhe custasse uma suave auto-mutilação, o que acontecia quase diariamente. A mensagem dizia “esquece essa febre e vamos sair”, e não era a primeira vez que ele a importunava no dia. Não aceitou o não, sem saber que mesmo sem febre ela estaria com febre.
Estava chorando muito, seus olhos antes amendoados tinham tomado uma forma esquisitíssima, quase oriental. Por que ele - não o outro - conseguia dar lhe facadas no peito como se falasse de flores? Tudo tão claro em palavras tão reconfortantes. “Pode contar comigo, respeito qualquer decisão que você tomar”. Aquele dia ela estava certa que o ia colocar no bolso dos esquecimentos, mas sabia que daqui uns dias ia ser como achar dinheiro em roupas não lavadas.
Pensou em pegar o carro, sair por aí, comprar um cigarro, tomar uma cerveja, sair correndo, fazer qualquer coisa que lhe desse mínimo prazer, nem que fosse o prazer do proibido, que era exatamente o que acabara de perder a razão em relação a ele - não o outro. Descobriu que os sentimentos geralmente vêm em opostos similares. Aquela dor era o amor que não conseguiu virar som e explodiu em água. Não conseguiu virar som, nos dois lados um estéreo mudo.
Ele - não o outro - disse que ela podia contar com ele num tom de voz que selava a verdade. Para ele, a clandestinidade dos dois estava perfeita e cômoda, e não ia mover uma palha leve para continuar com ela caso ela resolvesse obrigá-lo a escolher. A escolha já estava feita e era isso que doía. Era a sensação dos vices.
Para que serve um vice? - se perguntava. Sabia que quando o presidente viajava o vice que assumia, e para ela isso fazia todo sentido. Sabia que o Vasco era famoso por ter sido muitas vezes vice, mas não se importava, pois não era vascaína e agora muito menos iria o ser.
“Cruz de Malta é o caralho, essa eu não carrego nem fodendo” pensou já sem nenhuma censura, tomando um gosto pela raiva e pelo prazer de poder ferir o mundo, para que assim ela fizesse parte dele.
Adormeceu ali naquela poça de lágrimas e acordou com o nariz entupido.

6 comentários:

Anônimo disse...

Você que escreveu?

Anônimo disse...

Tá muito bem escrito! Tem umas metáforas bem elaboradas!

Anônimo disse...

Cóga você é muito gostosa!

hehhee

pô, sabe que esses dias eu tava pensando em fazer um blog pra pôr uns continhos e outros trecos? de repente é uma boa mesmo...

saudades de blog. nostalgia de coisas que aconteceram menos de 3 anos atrás. tô trabalhando demais, deve ser isso.

Fernanda disse...

não sabia que você escrevia...
sempre me perguntei pra que serve, né, sofrimento assim, só por sofrimento mesmo.
beijo.

Mari disse...

:(

coga você é gostosa!

(não podia perder a piada, apesar de já ter sido feita).

bem vinda ao clube da nostalgia, eu me juntei a ele faz pouco tempo tb...

beijos

Anônimo disse...

Nem só por piada, você é muito gostosa.

O texto está muito bem escrito mesmo. Me deixou muito pensativo.

Será que prossegue criando? Gostaria de ver.

Beijo.